O tempo continuava a passar devagar, os dias estavam mais longos e as noites mais torturantes, as dúvidas pairavam em minha mente. "Quando eu havia perdido o controle da situação?".
A música que ecoava em meus ouvidos era uma tentativa de reorganizar tudo o que havia acontecido, eu tinha feito muito mais do que amá-lo. Eu havia entregado o meu coração a ele e agora ele estava quebrado. Em pedaços. E mais uma vez as lágrimas voltavam ao meu rosto. "Todos os desafios e sacrifícios que eu fiz por ele, será que valeram de alguma coisa? O que eu era para ele de verdade? O que eu representava? Por que eu havia escolhido aquele garoto, por que eu o conheci?". Então as lembranças daquele dia estavam voltando de forma tão clara como naquele fatídico dia de inverno.
***
Era inverno. O céu estava nublado e a brisa gélida adentrava a janela do meu quarto escuro iluminado fracamente pela lua embaçada pelas nuvens. As folhas balançavam em uma dança suave e algumas caiam da copa da goiabeira.
Eu estava deitado na minha cama, olhando o céu com os fones no meu ouvido, pensando em como a vida poderia ser mais injusta comigo do que já era. Algo me faltava e o vazio estava ali, então me levantei calmamente da minha cama, peguei uma toalha e fui para o banheiro. Deixei que a água quente relaxasse meus músculos.
Não havia muito em que pensar. Na verdade não havia nada a se fazer. Eu já estava cansado de tantas tentativas fracassadas e de mágoas que eu já sofrera e por mais que as lágrimas escorressem pelo rosto triste e se confundisse com a água, aquela dor ainda estaria ali.
Terminei meu banho e voltei para o quarto vestindo apenas uma bermuda por cima da cueca boxer vermelha e liguei o computador acessando a minha rede social favorita. Havia um novo convite, olhei para a foto vagamente, a pessoa que estava lá era bonita, mas não havia um sentimento de interesse da minha parte. "Será só mais um amigo.", pensei comigo mesmo ao aceitar o convite. Abri a janela de diálogo e iniciei uma conversa para me distrair um pouco.
"Seja bem-vindo."
"Obrigado.", ele disse.
"O que conta de bom?"
"Na verdade nada, só que vou deixar meu primo em uma festa de aniversário e vou ficar no shopping por umas três horas esperando a festa acabar."
"Por que você vai ficar três horas esperando?"
"Minha tia quer que eu fique para assim que acabar levá-lo para casa."
"Ah, entendi. Nesse caso se quiser posso ir ao shopping, a gente conversa e ajudo você a passar o tempo."
"Eu iria gostar muito."
"Certo. Que horas mais ou menos?"
"As oito na praça de alimentação?"
"Sim. Estarei lá de camisa branca."
"Eu vou de preto. Então até lá."
"Até."
Desliguei o computador e voltei para a cama, deitei e por um momento visualizei o rosto dele e logo em seguida tirei a ideia da minha cabeça.
"Um amigo. Somos amigos, apenas.", repeti a frase em minha mente e o pensamento se perdeu em algum lugar dela.
Coloquei os fones em meus ouvidos e voltei a escutar música, e em algum momento eu dormi.
— Alex — A voz da minha mãe irrompeu o silêncio do meu quarto. — Acorde, não vai dormir sem jantar novamente, são sete e meia e você tem que comer algo.
Gemi e abri meus olhos devagar, ela havia acendido as luzes do quarto. Meus olhos se fecharam em protesto, mas me levantei vagarosamente e segui para o banheiro. Lavei meu rosto e me olhei no espelho.
Meus cabelos curtos e negros estavam desalinhados, meus olhos castanhos harmonizavam com minha pele parda. Minha barba estava por fazer, e meu cavanhaque pedia um aparamento. Concentrei-me nessas atividades, tirei o bigode e aparei o cavanhaque, escovei os dentes e dei um largo sorriso — todos dizem que meu sorriso é lindo — lavei novamente o rosto e me olhei cuidadosamente.
Eu não era nem de longe feio. Ri com a ideia em minha mente e fui para a cozinha, meu prato já estava na mesa. Minha mãe — Lisa — tem cabelos curtos e negros, olhos castanhos, pele parda, um metro e sessenta, sou mais alto que ela quinze centímetros. Tem um gênio forte, é brigona, mas ainda sim a amo. Pois é a obrigação dela, briga comigo para o meu bem.
Na mesa da pequena cozinha, havia um prato com arroz, feijão, salada, uma coxa de frango e um pedaço de lasanha. Olhei vagamente para a cozinha, que tinha uma pia, e o fogão ao seu lado. A mesa de vidro de oito cadeiras ficava no centro, a minha esquerda a geladeira e a minha direita o balcão. Minha mãe se sentou e me olhou.
— Vai sair?
— Sim, vou me encontrar com um amigo no shopping para colocar o papo em dia.
— Não vá chegar tarde em casa.
— Sim, senhora. — ri brevemente.
Terminei de jantar, bebi um copo de suco, voltei rapidamente ao banheiro, escovei os dentes, depois coloquei uma camisa branca, borrifei perfume em mim, peguei o carro e saí.
Liguei o som do carro e ouvindo música me distraí pelo caminho. Quando cheguei ao shopping procurei por uma vaga e estacionei, entrei e fui para a praça de alimentação. Eu havia me atrasado uns dez minutos.
As pessoas iam e vinham pelos corredores do enorme shopping, já havia passado vinte minutos desde que eu cheguei. "Só mais dez minutos, se não aparecer eu vou para casa.", pensei ao levantar o braço para olhar o relógio em meu pulso quando então eu o vi.
Ele vinha caminhando, de camisa preta com um cordão no pescoço com três pimentas nele, uma vermelha, uma preta e outra em azul-marinho. Ele estava de bermuda e chinela. Era alto, cabelos loiros, olhos claros, alvo com um sorriso no rosto.
Meu mundo parou por um momento ao observá-lo se aproximar de mim. Ele se sentou e sorriu. Retribuí. Uma lembrança havia tomado meus pensamentos.
SEIS ANOS ANTES
Eu estava na calçada em frente à casa da minha avó. A casa era simples, mas eu não me importava. As paredes não eram rebocadas e mostravam claramente a sua simplicidade e foi nesta situação que eu fui criado, com muito orgulho do caráter e do homem que hoje eu sou.
Eu esperava a ligação de Junior, da minha estatura, moreno, olhos castanho-escuros, cabelo moicano. Naquela época eu não pensava em namoro e nem em nada do tipo, mas ainda sim dei a ele meu número depois de muita insistência.
O telefone tocou após dez minutos que ele pegou.
— Oi. — Ele disse.
— Oi.
— Você acredita em amor à primeira vista?
— Não — respondi veemente.
Ele riu brevemente.
— Pois deveria acreditar, pois me apaixonei por você na primeira vez que te vi.
***
Nunca achei que fosse possível algo desse tipo, na verdade nunca acreditei. Mas há um ditado popular que diz: "Nunca diga que desta água não beberei, pois você pode acabar se afogando nela.". E foi em meio a esses pensamentos que tive que aceitar algo que eu nunca acreditei, algo que eu achava ser surreal.
Eu estava apaixonado pelo garoto que acabara de sentar na minha frente.
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